terça-feira, fevereiro 20, 2007

Lenta Digestão


Gostaria de escrever algo significativo aqui. Não por vontade. Mas para dar notícia de alguma sobrevivência aos amigos. Todavia, pelos lampejos de glória e intensidade dos absurdos, 2007, por enquanto, só conseguiu me calar. Faço de conta que não estou prestando atenção, guardo tudo para digerir no ritmo lento do meu fraco estômago e fico com o consolo do meu conterrâneo Manoel de Barros e seus pacientes caramujos:

Há um comportamento de eternidade nos caramujos.
Para subir o barranco de um rio, eles percorrem um
dia inteiro até chegar amanhã.
O próprio anoitecer faz parte de haver beleza nos caramujos.
Eles carregam com paciência o início do mundo.
No geral, os caramujos têm uma voz desconformada por dentro.
Talvez porque tenham a base trôpega.
Suas verdades podem não ser.
Desde quando a infância nos praticava na beira do rio
Nunca mais deixei de saber que esses pequenos moluscos
Ajudam as árvores a crescer.
E achei que essa história só caberia no impossível.
Mas não, ela cabe aqui também.

(Manoel de Barros, Os Caramujos. In. Tratado Geral das Grandezas do Ínfimo. Record, 2001).

Nenhum comentário: