segunda-feira, outubro 24, 2011

quinta-feira, outubro 13, 2011

Supernovas


Supernova I

sou uma mulher que pulsa
um oco no fim da expiração
um lugar seguro
no quintal da infância
onde eu brincava só

sou um brincar que pulsa
um sopro no fim da expiração
um vôo no portal da infância
um quintal no fim
uma mulher só


Supernova II

sou um pulsar que brinca um oco no quintal
uma mulher na infância sou um vôo no fim
um oco no portal um quintal no fim um lugar
uma mulher um sopro um vôo sou um sopro
no fim uma mulher na infância um pulsar um
brincar um vôo sou só um sopro no fim só
um sopro que pulsa que brinca que voa

Supernova III

sou
um pulsar
que brinca
um oco
no quintal
uma mulher
na infância
um vôo
no fim

sou
um oco
no portal
um quintal
um lugar
um vôo
uma mulher
um quasar
um brincar

sou
um sopro
no fim
um vôo

quinta-feira, outubro 06, 2011

domingo, outubro 02, 2011

Psicopompo


Auguste Rodin.
Gênio do Repouso Eterno, 1899
Pinacoteca. Parque da Luz/SP

Penetra surdamente no reino das palavras...
Drummond. Estação da Luz/SP

Já não me importa ganhar coisas. Nem pessoas. Muito menos o mundo. Ver tudo da minha janela já me basta. Viajo por obrigação. Com objetivos definidos, datas e locais bem arranjados. Mas, faço sempre com má vontade, nunca sem tensão. Foi assim que cheguei pela primeira vez em São Paulo este ano. Cidade ambígua e silente. Sim, havia muito silêncio no murmúrio indefinido das ruas, nas conversas esparsas, no deslocamento rápido e ensimesmado de pessoas nos ônibus, nas estações de metrô. Tanto ruído, quanto silêncio. Éramos seres impessoais, encapsulados em pequenos mundos, personagens no enredo de um filme de ficção científica.
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Da segunda vez, entretanto, algo diferente aconteceu. Hospedei-me em um lugar central, entre ruas escuras cheias de histórias noturnas. De repente, a São Paulo silente dos seres de plástico, soltava o corpo e a voz entre loucos carros e sussurros, no tilintar de copos em bares bêbados, no ranger de portas entreabertas das boites, no salto de mulheres que animam o vai e vem das esquinas, na súplica dos moradores das calçadas, no cochichar de combinações e segredos dos cantos obscuros.
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Em meu temor forasteiro, encontrei um amigo. Assim, de forma meio inesperada, sem contabilizadas garantias, quase sem querer. De entrada, forneceu-me um cartão de metrô com passagens pagas para que eu não ficasse em filas. Indicou-me rotas facilitadas para que eu não me perdesse na imensidão das ruas. Pagou-me cafés. Enviou-me sms’s com msgs desconcertantes, do tipo: comeu? tá onde? te espero no bloqueio do metrô. Nos intervalos da obrigação, insistiu para que eu visitasse obras, jardins, exposições, experimentasse as frequentações do espírito. Segurou minha mão para me proteger, manter-me em equilíbrio no passo e no ritmo, sem saber que meu corpo-espírito ferido beirava a exaustão e o desalinho.
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Aceitei tudo com dificuldade e parcimônia. Preciso de tempo para digerir dádivas. Neste transe iniciático, ele foi o instrutor, o guardião-guia no umbral desta dura travessia metonímica. Com percepção lenta para os milagres do instante, não me desculpei por não conseguir absorver de forma plena os valiosos presentes que recebi, assim, de maneira tão generosa, nem mesmo sei se soube agradecer a passagem, as entradas que me transportariam da república à estação da luz. Foram momentos de diálogo mudo, instantes em que as falas sem sentido e os corpos tristes das ruas se transformariam no reino das palavras e em esculturas e formas transmutadas em beleza e criação.
(para Leo)