domingo, março 29, 2009

Então

Então, minha mãe estava doente e queria conhecê-la. Não deu tempo. Ela faleceu antes. Uma um ano antes da outra. Ter quarenta anos é, dentre outras coisas, começar a participar do cruel e implacável espetáculo humano de perdas sucessivas. Depois ainda querem que conheçamos pessoas novas para amar todos os dias.

Então, ela, que já sabia, entendeu profundamente que o maior inimigo do amor não é o ódio, é o medo.

Então, ele contou que todos os seus problemas estavam em torno de uma criança sofrida. E que ao buscar uma imagem que o confortasse, ele via a mãe, falecida, ajeitando-lhe um cobertor durante a noite. A busca desse aconchego estava, todos os dias, acima do preço que tinha que pagar para recebê-lo. E ele estava farto de pagar o preço para se cobrir de amor.

Então, ele revelou que discutiram como eram opostos nos aspectos profissional e emocional. Perguntei-lhe sobre mim e ele deu-me o xeque mate: profissionalmente você é perfeita, emocionalmente, você é um blefe.

quarta-feira, março 18, 2009

Ansiedade


Faça um chá de erva-cidreira-folha-corta-a-mão que sua avó tinha no quintal. Ainda quente, coloque numa xícara alta, decorada, a que você acha linda e que, de preferência, tenha sido um presente intuitivo de um amigo que você ama. Coloque-a ao lado do computador e curta devagar o prazer de segurá-la por inteiro, os quatro dedos na alça grossa, a outra mão que abraça o copo. Logo você se sentirá mais aquecida e menos trêmula. Feche os olhos por instantes, respire devagar, sinta o aroma. Tome o chá em pequenos goles intercalados, entre hiatos de pensamentos tristes, questões insolúveis, cansaço criativo. Ensaie um texto, escreva sonhos cansados e espere o poema.