domingo, novembro 27, 2011

"A Nave Fantasma"

Yoko e Lennon - créditos

Como termina um amor? - O quê? Termina? Em suma  ninguém - exceto os outros - sabe disso; uma espécie de inocência mascara o fim dessa coisa concebida, afirmada, vivida como se fosse eterna. O que quer que se torne objeto amado, quer ele desapareça ou passe à região da amizade, de qualquer maneira, eu não o vejo nem mesmo se dissipar: o amor que termina se afasta para um outro mundo como uma nave espacial que deixa de piscar: o ser amado ressoava como um clamor, de repente, ei-lo sem brilho (o outro nunca desaparece como se esperava). Esse fenômeno resulta de uma imposição do discurso amoroso: eu mesmo (sujeito enamorado) não posso construir até o fim minha história de amor: sou o poeta (recitante) apenas do começo; o final dessa história, assim como minha própria morte, pertence aos outros; eles que escrevam o romance, narrativa exterior, mítica. (Roland Barthes. Fragmentos de um Discurso Amoroso).  

segunda-feira, novembro 21, 2011

Vivo em Goi


Leonardo Lobo

FUTURARTES

meu futuro está nas artes
meu futuro está presente
e eu estou desferrolhado
(...)
assim como na dor
é dever gargalhar
como assim no azedume
é dever amar
e na falta de amor
armar, inventar
inverter
(...)
eu quero mesmo isso aqui?
é isso mesmo isso daí?
pelo que me cabe
talvez eu esteja
carente doente
dormente
quente

(Leonardo Carmo)

domingo, novembro 20, 2011

A Sagração





"Sonhei com um grande ritual pagão! Tive uma soberba visão
repleta dos mais inusitados efeitos  sonoros indefiníveis..."


Em três tempos sagra-se uma mulher à primavera. Ela parte de si. A música lhe chega como sedução leve, alento aos seus dias limitados em forma e construção de sentidos. Ela se entrega aos poucos, até que a música a tome, afinal. Ela se dá ao piano, aos sons, aos impulsos das forças anímicas que a colocam no limite entre os mundos humano e animal. Rastejante como um réptil, agressiva e armada como um tigre, ela se movimenta, dissonante, e agoniza. Ao fim deste ato, ela já está despida do que a limitava em espaços e formas. Desconstrói-se nos ímpetos entre ritmos e pausas. Timbres, percussões e ritmos acima da harmonia, transformam-na em uma noiva primitiva. Algo enfim, se define e costura uma trama. Como Ariadne em torno do labirinto, ela enlaça fios entre a razão e a loucura. Forças primitivas incontroláveis violentam o ato e a impelem à construção de uma geografia sagrada, gestos que se ritualizam na repetição e nos impulsos. Ao final, no colo do piano, ela se transmuta em uma massa informe, algo ainda não nascido, zoomórfico, um ser que ensaia um vôo frágil.