sexta-feira, julho 08, 2005

Respire, as ondas vêm e vão.

Ouço sempre a frase do título quando estou ansiosa. Minha filha costuma dizê-la, ao mesmo tempo em que me endireita a coluna. De fato, penso que a grande solução da vida é respirar. Permitir que o fluxo entre e saia sem obstáculos, o que não é nada fácil. Pude compreender melhor o poder da atitude quando me submeti a uma seção de respiração holotrópica. Era uma loucura proposta pelo meu terapeuta transpessoal. A sensação é a mesma no caso do uso de LSD. Ele me explicava, piorando as coisas, visto que nunca usei drogas de nenhuma espécie. As mãos podem se enrolar. Eu arregalava os olhos. Os pés também. Você pode ter visões. Misericórida. Eu já havia desistido, quando ele me apresentou a solução mágica para resolver qualquer efeito colateral da atividade: respire. Simplesmente continue respirando. E lá fui eu, acompanhada por alguém que não conhecia (pois precisamos ser cuidados por outra pessoa durante o ato), um garoto adolescente que parecia muito mais corajoso do que eu. Tadinho. Ele teve que se levantar inúmeras vezes para me levar ao banheiro. Minha seção de respiração holotrópica transformou-se numa vontade ininterrupta de fazer xixi sobre o mundo. Meu terapeuta disse que foi uma profunda limpeza. Achei melhor acreditar. E, é claro, fiz várias outras seções até perder totalmente o medo e experimentar um contato mais íntimo comigo mesma. Acho que foi útil como estratégia de auto-conhecimento. Além de me ensinar o princípio básico da respiração. Ansioso? Respire. Triste? Respire. Nervoso? Respire. E por aí vai. Sigo assim, todos os dias, até não sei quando, tentando manter o ritmo da respiração. Como as ondas, que, inexoravelmente, vêm e vão.
Como no poema do Luís.
As ondas vêm e vão

inspiro.
atento à sensação
produzida nas narinas
pelo ar que entra.
expiro,
atento à sensação
produzida nas narinas
pelo ar que sai.
inspiro.
a partir do ventre,
a centímetros do umbigo,
o tórax enche.
expiro.
a partir do ventre,
centímetros abaixo do umbigo,
o tórax esvazia-se.
inspiro, expiro.
respiro.
deixo-me respirar,
nada mais.
Mas, de repente, forço-me a respirar,
e inspiro e expiro com aparato,
descontrolado,
o equilíbrio perdido.
recordo-me então
que as ondas vêm e vão,
e deixo-me ir, deixo-me ir.
inspiro, expiro.
respiro.
deixo-me respirar.
não estou ansioso, nem calmo,
nem triste, nem feliz.
respiro, nada mais.
e as ondas vêm e vão.
(Luís Ene)
Obrigada, querido. Adorei.

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