domingo, junho 01, 2008

Mosaico

Há pouco descobri-me um mosaico de contradições.
Quero ouvir outros sons que não os da minha dor híbrida.
Os da minha ansiedade mundana ou da minha solidão sagrada.

Irrito-me com a TV da sala
e a velha música barroca não abafa os meus gritos.
Tem alguém aí? Alguém menos surdo, cego e incapaz?
Alguém menos limitado e com esperança? Não há resposta.

Concentro-me no diálogo do cello com o violino e eles choram.
Aumento o volume. Quero ouvir meus próprios sons.
As horas não passam, os dias não passam, a vida parece eterna
e é tudo tão lento, frágil e inútil. Escrevo até cansar os dedos,
embotar a mente, até que o cansaço me cale a voz, o corpo,
o medo de encarar a noite e os sons deste silêncio surdo.

E eu que pensei que não havia enredo nesta trama,
fio condutor nestes fragmentos, estilhaços de um mosaico
em que revejo-me inteira, inacabada, estranha e exausta.

Preciso acompanhar as variações do violino.Elas haverão de levar-me
a um lugar de sentido.Os sons inundam a sala. Imagino espaços,
visualizo pessoas, mas o allegro se transforma em adágio
e novamente me disperso, ouço os sons do teclado,
os chiados abafados da TV vindos da sala. O oboé me resgata.

Deixo-me levar por um cravo que recomeça.
Um violino costura tudo e parece contar uma história.

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